São Paulo comemora 463 anos com o retorno do tradicional Bolo do Bixiga

 São Paulo comemora 463 anos com o retorno do tradicional Bolo do Bixiga

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A comunidade do bairro paulistano do Bixiga se uniu e conseguiu resgatar uma tradição interrompida há nove anos: a confecção do bolo de aniversário do tamanho que São Paulo merece! Tudo começou em 1986, a festa foi interrompida em 2008 e retornou nessa quarta, 25 de janeiro, para celebrar os 463 anos da capital paulista.

Um mosaico de cores e sabores marcou a volta do bolo comunitário, feito pelos moradores da tradicional comunidade italiana e boêmia. Associações e empresários somaram ao “mutirão de aniversário” e para completar a festa, a indústria alimentícia “Renata” doou 3200 unidades de bolos, que foram distribuídos a quem enfrentou a fila, depois de saborear os pedaços que foram distribuídos pouco antes do meio-dia.

Moradores, vizinhos, comerciantes, artistas e confeiteiros anônimos e famosos participaram da festa que, este ano, não deu muito trabalho aos varredores da cidade.  Maria Alves e Carlos Roberto só deram uma paradinha na lida para comer um pedaço de bolo. Afinal, eles estavam na labuta desde às sete da manhã.

“Sou cearense de nascimento, mas paulistana de coração”, confessou a trabalhadora. Há 36 anos, com apenas 20, ela veio para São Paulo atrás de uma missão muito especial: juntar dinheiro para comprar uma casa para o pai, que tinha deixado no Ceará.

“Ele ficou doente e perdeu tudo o que tinha, inclusive seis casas. Eu trabalhei muito e um ex-patrão, senhor Luis, dono de uma padaria, me emprestou 12 mil cruzeiros. Comprei a casa do meu pai de volta e em um ano paguei a dívida, mas não voltei mais para o nordeste. Hoje ela tem um filho paulistano, cobrador de ônibus, que aos 21 anos estuda engenharia.

Carlos considera-se paulistano, apesar de ter nascido em Diadema, no ABC Paulista. Morador do Capão Redondo, ele é veterano na festa do Bolo do Bixiga. “Vai ter muito lixo e desperdício, mas nós estamos aqui para limpar”. A previsão não se concretizou, mesmo assim ele se esmerou na limpeza, ao lado da colega. Sorte deles que a chuva que ameaçava cair não veio…

Para eles, falta consciência dos paulistanos em relação ao lixo. “O pessoal joga lixo na rua e diz que é para garantir o emprego da gente, mas não é verdade. A cidade precisará de varredor de qualquer jeito. Afinal, se não tiver lixo sempre teremos as folhas para varrer…” A maior bronca é com os fumantes que jogam cigarro aceso e bituca no chão.

Há um ano e meio a dupla, cada um tem 20 anos de atividade na limpeza urbana, se ajuda mutuamente, um apoiando o outro profissional e pessoalmente. Enquanto Maria deseja menos sujeira na cidade, em todos os sentidos, Carlos pede mais amor. “O negócio aqui está feio, pois tem muita violência na cidade”, justificou.

Do outro lado da rua, os colegas Ana Paula, Diego, Marcos e Rogério descansavam no horário do almoço antes de retomar o trabalho da varrição. De um lado a feira livre, do outro, a festa de aniversário da cidade. Bem-humorados, eles não reclamam do trabalho, muito pelo contrário. Ressentem-se apenas da “falta de respeito e educação do povo que faz das ruas de São Paulo uma grande lixeira.”

“Tem gente que joga lixo na nossa frente dizendo que paga os nossos salários. Gente que destrói as lixeiras, gente que suja a cidade com fezes de cachorros, latinhas e garrafas, sem se preocupar com o outro. Pessoas que têm mentalidade mais suja do que o lixo”, denunciam.

O que eles desejam para São Paulo no dia do aniversário da cidade? “Consciência, cultura e respeito em relação ao lixo”, responderam unanimemente. “A cidade é nossa, é preciso cuidado!”

Tradição de avô para neta

Thais Taverna, organizadora do evento, contou que pelo menos 300 pessoas somaram esforços para que o Bolo do Bixiga voltasse ao ser formato tradicional. “Fomos de porta em porta pedindo ajuda, mobilizamos a sociedade pelo Facebook e após um mês conseguimos retomar a tradição”, contou.

Neta de um dos idealizadores da festa que anualmente enche a Rua Rui Barbosa de alegria e sabor, na hora do “parabéns a você” ela já tinha um desejo em mente. “Desejo a união para todas as pessoas do Bem”, disse.

Áurea Amélia Cavichioli tem 62 anos e vive no bairro há 37. Ela migrou de São José do Rio Preto para São Paulo quando casou.  Teve dois filhos paulistanos, separou, enviuvou e nunca mais saiu da cidade. “Eu quero morrer aqui. São Paulo é tudo de bom”, afirmou. Voluntária, ela trabalhou a manhã toda para arrumar a mesa imensa e também para servir os convidados e limpar o lugar.

O vice-presidente da escola de samba Vai-Vai, Tobias, também prestigiou o aniversário de São Paulo. Para ele, o presente ideal para a cidade seria o tombamento do bairro do Bixiga.

Conhecendo a história do bolo que entrou para o livro dos recordes

Armando Publisi teve a ideia e o amigo Walter Taverna, 83, moradores do bairro do Bixiga, decidiram homenagear a cidade há 21 anos. A novidade era fazer um bolo que, em metros, correspondesse à idade da cidade. “A gente tinha mania de sempre fazer alguma coisa”, contou o famoso morador da Rua Treze de Maio. 

Com a morte da Armandinho do Bixiga, em 1994, seu Walter continuou a festa até que uma grande confusão, quando os populares literalmente avançaram e fizeram uma guerra de bolo em plena rua acabaram com a festa. O bolo, tradicionalmente feito pela comunidade deu lugar aos manufaturados industrialmente. Agora, a tradição foi retomada. “É o nosso presente para São Paulo. É a união das famílias do Bixiga, sem preconceitos”, afirmou.

Quando o bolo acabou e a festa continuava com música no palco, discretamente uma pessoa fazia uma oração, em silêncio… Era o senhor Osvaldo Souza de Medida, espírita, que pedia pela cidade e seus moradores. “Rezo para que não falte comida para o povo de São Paulo”, contou.

Evento oficial do calendário municipal desde 2015, o Bolo do Bixiga entrou para o Guiness Book como o maior do mundo. O mais bacana, entretanto, é ver a comunidade empenhada e trabalhando junto, provando que São Paulo, apesar de ser uma das maiores metrópoles do mundo, ainda cultiva a amizade, as relações de vizinhança, a tradição, a solidariedade. Sobretudo, tem um povo que se orgulha e ama a sua cidade. Parabéns São Paulo!